Um dos tópicos da minha palestra sobre ecologia de orquídeas é buscar desenvolver o raciocínio para interpretações das relações entre os solos e as formações vegetais, assim como algo mais aprofundado estará em "Paisagens, habitats e ecologia de orquídeas".
Fiz o EdafoPedos com a intenção de não misturar muito os dois assuntos que tanto gosto, solos e orquídeas, mas acabo de ver que vai ser difícil não misturá-los eventualmente.
O conhecimento sobre as relações existentes entre os solos e a vegetação aplicam-se, por exemplo, no subsídio técnico de planos de manejo de parques e de outros tipos de áreas de preservação, pois temos os solos como os grandes estratificadores dos ambientes e conseqüentemente dos nichos ecológicos que os seres vivos ocupam.
Os tipos de solos mesmo que em pequenas áreas podem variar bastante, e com isso as formas de vida que o habitam, especialmente as fitofisionomias, em outras palavras, se os solos mudam, geralmente as espécies de árvores e/ou arbustos também de forma abrupta, e com isso as espécies de orquídeas e bromélias epífitas e até mesmo os animais vão juntos.
Certa vez tive a oportunidade de acompanhar um amigo em uma coleta de amostras de solos em um parque nacional, ocasião em que este também fez a apresentação oral do relatório do meio físico (solos, geologia e relevo) no qual a equipe que ele integrava fez para este parque, lembro da diretora deste parque comentado o episódio em que estava presente um botânico pesquisador antigo da área, muito respeitado nacionalmente e internacionalmente, inclusive descobridor de espécies de plantas novas para a ciência naquele parque, que durante uma outra ocasião em que foi apresentada uma versão preliminar deste relatório este pesquisador comentou:"trabalhei aqui a vida toda e só agora depois da apresentação de vocês fui entender um pouco o porquê de certas espécies ocorrerem onde ocorrem!".
Mais um episódio em que é nítida a importância de se integrar diferentes tipos de conhecimentos para que a ciência não ande em círculos, para que avance.
É essencial também levar em consideração o aspecto antropológico para se entender um pouco a vegetação, ainda mais em áreas imensamente antropizadas que ocorrem na região Sudeste do Brasil.
Abaixo fotos de uma ida à zona rural de Guaraciaba/MG, Zona da Mata de Minas Gerais, uma região que foi imensamente desmatada e cultivada com café durante o ciclo de ouro do café no Brasil, nas idas do final do séc. XIX e início do séc. XX.
Reparem nos pontos prateados no meio do verde escuro da mata secundária. Tratam-se de embaúbas ou banana-de-macaco ou árvore-de-preguiça (Cecropia sp.), árvores geralmente de ocorrências associadas às matas secundárias, e não sei se seria correto subdividir ainda como fase de início da mata secundária (mas a idéia esta aí), por isso são boas indicadoras de "idade da mata". Mata muito prateada por causa das embaúbas por aqui na região é mata mais jovem.
Na primeira situação é muito difícil encontrar-se orquídeas epítitas, excessões como algumas Catasetum geralmente em clareiras ou nos ponteiros de galhos mais altos, já na segunda, a dificuldade em se encontrar orquídeas nas árvores estaria exatamente no fato da área vir sofrendo muita coleta (considerando o fator antrópico de novo!), especialmente da C. schilleriana, uma vez que o ambiente em si é mais propício à ocorrênia de maior diversidade de orquídeas.
Locatelli,
ResponderExcluirBom este seu post. Tenho apenas uma ressalva a fazer. Em certo trecho você diz que a proximidade do saprolito da superfície do solo poderia significar uma (relativa) maior fertilidade do solo. Você corretamente chama a atenção para o fato de que esta maior fertilidade é relativa a uma outra situação de solos ainda mais pobres, mas creio que é válido também chamar a atenção para o fato de que nesta região a proximidade do saprolito nem sempre se reflete em melhores condições de fertilidade já que o próprio saprolito foi há muito intemperizado quimicamente, ainda que mantenha as feições macroscópicas da rocha original, e muitos dos elementos que teriam interesse em termos de nutrição vegetal já foram há muito lavados. A poucos quilômetros de onde foi tirada esta foto sua, ainda no município de Guaraciaba, há solos se desenvolvendo sobre saprólitos bastante superficiais, mas estes apresentam quase que só quartzo e muscovita: os feldspatos já se transformaram em caulinita e a biotita em hematita ou goethita.