Recentemente defendi minha dissertação de mestrado em Solos e Nutrição de Plantas na Universidade Federal de Viçosa e considero que esta foi uma experiência muito interessante, e que realmente foi uma “divisora de águas” entre uma filosofia de vida que eu estava inclinado a ter com uma que agora tenho certeza que quero ter, propriamente dizendo.
Confesso que não entendia direito o significado desta formalidade de defesa de dissertação ou de tese de pós-graduação até chegar minha vez. Achava que era só um tipo de burocracia acadêmica a mais, que não fazia diferença na minha formação por causa de tudo o que eu já havia estudado e aprendido até esta “hora h”.
Cada universidade, bem como cada programa de pós-graduação dentro de uma mesma universidade, costuma ter alguma particularidade, especialmente no que se refere ao momento da defesa.
Na minha ocasião funcionou basicamente da seguinte forma: eu em uma sala, sentado na cabeceira da mesa e a minha volta quatro professores com a função de questionar e fazer sugestões relacionadas ao trabalho, e mais o meu orientador que fazia o papel de moderador, então éramos seis no total.
Bom, a coisa lá foi feia, uma verdadeira lição de humildade para alguém ainda relativamente novo e com o risco de se achar o rei da cocada preta por causa do título de Magister scientiae. Basicamente a lição era “você vai sair daqui com o mestrado mais não se esqueça que você é um bosta, tem um longo caminho pela frente, não pare nunca” (perdão pelo vocabulário, mas o que seria da língua portuguesa sem os palavrões para manifestar os sentimentos?!). Cada um deles me apertou até onde viram que sairia mais nada, até meu limite, mais tudo dentro do profissionalismo e fazendo críticas sempre construtivas.
Cresci demais nessas quatro horas e trinta minutos de duração da minha defesa de dissertação de mestrado, foi um verdadeiro upgrade na minha formação, realmente vejo que não dava para ter passado sem aquele momento.
Depois mais de noite, na hora de enfiar o pé na jaca para comemorar, quando meus amigos foram chegando e me perguntando como havia sido, fui respondendo: “apanhei igual vaca na horta... Mais foi bem construtivo, aprendi bastante!”. Minha ressaca pós-defesa (por causa da defesa mesmo, e não pela cerveja que estamos já mais acostumados) durou bem uns três dias, uma enxaqueca contínua.
Por essas e outras que cada vez mais vejo a orquidofilia como algo muito esquisito em certas ocasiões, por exemplo, temos aquele cenário clássico de associação orquidófila antiga no interior (reparem no detalhe, associação antiga e de interior- cheia de ranço) com um “cabeça branca” tido como papa regional no centro de tudo, com o qual todos concordam em qualquer assunto técnico que seja, especialmente por não serem da área e não terem tanta vivência ao ponto de adquirir argumentos. Verdade seja dita, realmente essas personagens realmente são os que possuem mais informação a respeito sim.
Considero-me feliz e privilegiado por ter tido a chance de ter feito o que quis e no lugar que também quis, e é onde vejo uma grande responsabilidade, porque é nítido que aquilo relacionado a qualquer área é cobrado pela sociedade na mesma proporção do peso do título e de onde ele saiu. Digo isso depois de muito bufar e coçar a cabeça arrancando os últimos fios de cabelo da minha cabeça que o mestrado deixou, ao ler muitos textos de revistas de orquídeas, bem como de listas de discussão por email, fóruns e até mesmo de livros com conteúdos absurdamente equivocados e desinformadores, isto é principalmente devido ao fato dos autores não terem por cima dos ombros o peso da responsabilidade de serem os mais exatos possíveis ao transmitirem conhecimentos.
Se no meio orquidófilo é sabido que você é um especialista, com alguma formação para isso, com a formação de engenheiro agrônomo, por exemplo, a cobrança é sempre maior, bem como a responsabilidade. Ao contrário do que seria em relação a um especialista “cabeça branca” que mencionei mais acima.
Quando se é apresentado como especialista se tem praticamente a obrigação de ser exato (de acertar sempre), de tomar cuidado com o que se diz ou com o que se escreve.
Uma breve interrupção que considero cabível é acerca da conceituação de “exatidão”: exatidão é algo real, por exemplo, se dissermos que a soma 1,99 + 1,99 é igual a 4,00 estaríamos sendo mais exatos do que se dissermos que a soma 1,98 + 1,98 é igual a 4,00, mas estaríamos absolutamente exatos somente se dissermos que a soma 2,00 + 2,00 é igual a 4,00. E “precisão”, termo que é rotineira e erroneamente usado como sinônimo de “exatidão”, é algo que faz alusão à repetibilidade de um dado evento, por exemplo, se uma calculadora com defeito de fabricação que para qualquer soma calcula o mesmo resultado, por exemplo, resultado 4,00 para qualquer soma, como 1,99 + 1,99, ou 1,98 + 1,98, ou ainda o absurdo de 1,36 + 1,36, ela é precisa em dar resultados igual a “4,00”, mas não é exata na sua soma, está como que “viciada” em resultar 4,00, mas se esta considerando a mesma soma “2,00 + 2,00” e por um milhão de vezes ela calcular o resultado como sendo igual a “4,00” pode-se dizer que ela é exata e precisa!!! (Conversa chata, reconheço).
Agora a aplicação desta conversa é a ciência como algo exato, ou seja, ela é o conjunto de leis que regem o Universo, e não há como ser diferente, mas o fato é que ainda está quase tudo por descobrir e aprender, e o que é “preciso” (se verifica muitas vezes, mas não em todas, quase exato) é pseudo-ciência, que mesmo assim não deixa de ser um tijolo importante na parede da construção da ciência, do poder de exatidão da mesma propriamente dito.
Orquidofilia no dia a dia é precisa, pois repete muito, tem muito empirismo mas pouquíssimas atitudes com exatidão.
Muitas vezes me senti pressionado intencionalmente em discussões pelas listas de email, exposições de orquídeas, cursos e palestras que prelecionei por aí, acredito que tenha me saído bem, porque nem de longe a bagagem dos “pressionadores” era equiparada à bagagem dos constituintes da minha banca de defesa de dissertação de mestrado...
Quero chamar a atenção para o contexto, algo como o modus vivendi do indivíduo que parece ter o perfil de gente mais maliciosa e auto - destrutivamente vaidosa que a meu ver não combina com o perfil de gente que tem humildade para reconhecer alguma limitação de conteúdo e procurar correr atrás de adquirir informações de qualidade, com isso refinando seu senso crítico e capacidade de observar o mundo e efetivamente “apertar” mais com perguntas.
Já tive grandes desafios, por exemplo, com o tipo de gente que espera o curso ou a palestra acabar e que chega para mim sem fazer muito barulho e solta uma pergunta “bomba”... Perguntas interessantes, trazendo maneiras diferentes de verem as coisas, maneiras estas que eu nem havia pensado antes, coisas que fazem a cabeça soltar fumaça e que fazem passarmos a noite sem dormir procurando na internet algo mais sobre os assuntos.
Algo muito frustrante já me aconteceu quando, por mais de uma vez, na camaradagem para alguns de certa forma mais próximos, ensinei semeio in vitro de orquídeas em troca moral de que divulgassem em suas respectivas associações o meu curso (deixava claro isso com todas as palavras).
Mas estranha natureza humana, pois em todas essas ocasiões quando depois pude ver pessoalmente, ou mesmo quando fiquei sabendo de longe, percebi que a pessoa para qual havia ensinado nunca havia falado a meu respeito, tão pouco divulgado meu curso, e ainda estava “pagando de gatão” no meio da galera por causa do diferencial intelectual que havia adquirido as minhas custas...
Para piorar, o curso de semeio em si não foi somente o semeio, foi uma tremenda de uma consultoria especializada em seu orquidário, acompanhada de aulas particulares de genética, fisiologia e nutrição vegetal, bem como de ecologia, de solos, de trambiques orquidófilos, dentre outras coisas.
Hoje meu comportamento diante das pessoas com atitudes que mencionei é nada além da “política da boa vizinhança”. Em um dado momento saíram ganhando, mas, por exemplo de novo, no caso do semeio por sorte passei o que na época seria “versão 1.0” da técnica, e hoje estamos na “versão 10.0”, com repique entre frascos usando os dedos, e não as pinças, para se pegar nas plantinhas e fixá-las no meio nutritivo do recipiente novo se quisermos, tudo isso sem câmara de fluxo laminar, capela, etc. Na pia da cozinha, com técnicas especiais de desinfestação e esterilização!!! Dentre outras coisas novas que vamos aprendendo no dia a dia.
Atualmente recebo muitos emails e comentários dizendo que sou muito desprendido em informação e que isso é raro na orquidofilia, mas já fui mais, embora não serei de novo, confesso. Por quê? Simples, minha profissão é esta, e daqui para frente preciso garantir o leite das crianças.
Também já fui criticado muitas vezes, pessoalmente inclusive, por estar sendo muito “capitalista”, diante de um posicionamento mais contido da minha parte, muitas vezes ouvi algo como “orquidofila é colaboração e tal...”. Críticas silenciadas na hora com uma resposta do tipo:“Você é médico não é? Então, se eu ou alguém da minha família ficar doente você consultaria na camaradagem também?; Engenheiro civil? Faz um projeto de uma casa pra mim?; Tem loja, não tem? Se eu precisar de algo de lá na camaradagem você me quebra o galho?”...
Colaboro sim até certo ponto, olhem este blog, a mais adentra no aspecto profissional.
Ah, o curso ou palestra é uma fortuna, é o preço de um vaso de Phalaenopsis ou de uma híbrida de Cattleya sem identificação florida na prateleira do supermercado, R$ 50,00 por pessoa, fechando uma turma de no mínimo 10 pessoas (para valer uma diária de qualquer profissional técnico graduado e free lancer – um salário mínimo), e mais as despesas de transporte, alimentação e hospedagem se for o caso. Mas se for uma espécie de “pacotão” com todos os 8 temas sugeridos no post anterior (aqui) para uma associação orquidófila talvez fique interessante negociar um valor fixo, e a entrada e número de pessoas fica por conta da associação.
Estava eu conversando com uma amiga agora mesmo pelo MSN e falávamos sobre o desânimo que muitas vezes dá para escrever no blog (como é meu caso) e ou postar fotos em listas de discussões sobre orquídeas. Importante acrescentar que esta minha amiga é uma orquidófila das mais tecnificadas que conheço, em grande parte pelo tipo de formação científica que tem, mesmo que esta não seja envolvendo plantas, mas a ciência em si lhe é algo cotidiano, tendo mais “jeito” com orquídeas do que muito biólogo e engenheiro agrônomo que conheço por aí...
Desânimo do tipo que tive depois de encaminhar recentemente, como de costume, um post para uma lista de discussão. Nesta ocasião, e também como que de costume, pouca gente parece ler, pouca gente responde, quase nunca emenda-se uma discussão... Mas nesta ocasião ouve um feed back no mínimo “interessante”, pois o post em questão sendo sobre habitats de orquídeas, e em uma postagem por alguém da lista sobre umas fotos de um habitat que a mesma pessoa havia conhecido ela me cita de uma maneira peculiar:
“O Marcus V. Locatelli alguns dias atrás postou Nesta Mata tem Orquídeas? E confirmou uma observação que tenho feito, sem base em nenhum estudo, pesquisa ou afins como ele, somente admirando a Natureza e desfrutando o prazer de frequentar esse lugar lindo, rico e diverso ao longo dos últimos 12 anos.”
Respondi citando um episódio escrito por Conan Doyle em que o Dr. Watson diz para o Sherlock Holmes que “Tudo é banal, uma vez explicado”, e acrescentei de maneira irônica que talvez a ciência serviria para não se gastar 12 anos no que poderia ser feito com 1 dia ou 5 minutos examinando uma imagem de satélite (de novo a idéia de EXATIDÃO que a ciência nos traz)... Dá também vontade de falar “perde tempo lendo meu blog não”.
Mais coisas frustrantes acontecem também na academia, como furtos e plágios de idéias.
É “estranha” esta mania das pessoas que de alguma forma menosprezam a ciência, quando ao mesmo tempo que se sentem confiantes em escrever livros, artigos em revistas ou na internet, justamente por acreditarem que possuem alguma bagagem “mais científica” ainda (mais EXATA sobre o tema).
Países de primeiro mundo valorizam mais ciência que o nosso, países com as maiores taxas de crescimento econômico também. Fiquei com preguiça de procurar fontes disso para citar por aqui, mas este é o tipo de coisa muito fácil de encontrar pela web e conferir.
A orquidofila no Brasil pelo que me parece, com preciosas exceções, valoriza o “achismo”, mas o importante é ser feliz, e de forma ignorante é mais fácil.
Um comentário:
Meu amigo, Esta nossa discussão será eterna. TU sempre do ponto de vista técnico e eu , ainda me preocupo com o grande potencial da orquidoculura/orquidofilia como fonte de renda pra micro produtor. Mas tenho certeza, que com tantos "achismos" os estrangeiros irão acabar de nos engolir. Este é o pais do sol. do clima e de tudo que elas gostam. Cultivar orquídeas assim não vai nos levar a lugar nenhum. Eu não sou ninguém e pouco entendo do assunto, mas o que faço , procuro ser a luz da ciência. Vicio da profissão.
Gostei do desabafo. As Listas me cansaram. As orquídeas me alegram, me fazem feliz. Perfumam minha casa e através delas conheci gente muito boa como tu e o “mala”. Para mim não é meio de fazer amigos. Acho que amigo é coisa séria . Esta palavra guarda uma grande responsabilidade. Não uso a toa.
Arrepiei-me com a descrição do momento da tua defesa............este ranço acadêmico tem sua importância. A ti ainda falta à bajulação que tanto os figurões gostam.Um dia tu aprendes........se não sempre terá um mais esperto no teu pé. Não vou dizer a raça pra não ter problemas judiciais. Mas tu me entendes.
Deus te proteja amigo
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