quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Ilha da Trindade - Habitat de orquídeas

Estive na Ilha da Trindade semana passada, fui coletar algumas amostras de solos para minha tese, solos esses bastante específicos, e embora não tenha sido meu foco principal minha expectativa em aproveitar a ocasião para ver a orquídea Polystachya estrellensis Rchb. f. 1852 era grande.

Para muitos esta orquídea pode não ter nenhum atrativo, mas essas da ilha tem um contexto interessante, estão isoladas quase no meio do Atlântico Sul, a cerca de 1.200 km da costa capixaba, o que corresponde a mais de 1/4 do caminho para a África, e é o território brasileiro mais a leste, o pedaço do Brasil onde o Sol nasce primeiro. Quatro dias de barco para ir, e mais quatro para voltar...






A ilha é nova, tem 3 milhões de anos, e é parte de uma grande cadeia vulcânica submarina orientada leste-oeste, chamada lineamento Vitória-Trindade, as outras montanhas do lineamento foram destruídas pela erosão marinha e seus topos estão hoje submersos, e possivelmente Trindade se manteve elevada por ter tido uma atividade vulcânica construindo seu terreno por mais tempo. Clima quente, do tipo Tropical Atlântico, onde a temperatura média anual está em cerca de 25 ºC, com frequentes pancadas de chuva ao longo do dia, quando nuvens carregadas de água esbarram nos topos dos picos e a chuva precipita, são os "pirajás" (do tupi "chuva rápida").

Atualmente a vegetação dominante é herbácea, relatos e indícios sugerem que a ilha teve a maior parte do seu terreno ocupada por uma floresta densa dominada por Colubrina glandulosa (pau-tucano) que sucumbiu especialmente pela ação de 300 anos de cabras, que foram introduzidas ali com os primeiros navegadores exploradores que desembarcaram na ilha.

Dentre os indícios estão muitos troncos caídos que vemos pela ilha, como o da foto abaixo:

Hoje há cerca de 130 espécies de plantas na Ilha de Trindade, considerando as plantas introduzidas pelo homem, as espécies que também ocorrem no continente, e algumas que só existem nesta ilha. Muitos devem ter ouvido falar da floresta de samambaias gigantes (Cyathea trindadensis) da Ilha da Trindade, de indivíduos com até 6 metros de altura, que ocorre apenas em um limitado terreno da ilha, onde tem um relevo tendendo ao côncavo que preserva mais água no solo, e é nas árvores entremeadas às samambaias gigantes que ocorre a Polystachya.









Polystachya estrellensis não precisa de inseto para ser polinizada, ela tem uma série de adaptações morfológicas que permitem a auto-polinização das suas flores, e dado ao isolamento geográfico da ilha insetos são relativamente raros de se ver, fico pensando se antes das cabras haviam outras espécies de orquídeas na ilha.


Infelizmente tive só 3 dias de permanência na ilha e tive que focar no trabalho e não vi ao vivo as orquídeas nem a floresta de samambaia gigantes,a s fotos são de colegas cujos nomes aparecem no canto delas, andei de um extremo a outro pela sua borda leste em busca de solos ornitogênicos, ou seja, que apresentam uma série de características particulares devido a ação da nidificação de aves marinhas nas proximidades, essas depositando muito nutrientes e permitindo a formação de ecossistemas bem peculiares.



















Ipomoea pes-caprae (esquerda) e Praia dos Andradas e Pico Pão de Açúcar no fundo (direita):
Grazina (Gygis alba) (esquerda) e borda do Vulcão do Paredão e Túnel (esquerda):
















Karol baixando os dados do sensor de temperatura e umidade de solo (esquerda) e eu coletando amostras de solos (direita):
 


Planta diferente na trilha do Platô do Noroeste (esquerda) e pirajá formando (direita):
 

 Atobá-branco (Sula dactylatra) (esquerda) e navio chinês naufragado ((direita):
 




















Assegurando a soberania brasileira sobre este território a ilha é permanentemente habitada pelo pessoal da Marinha da Brasil que mantém o Posto Oceonográfico da Ilha da Trindade (POIT), um pouco da história da ilha pode ser vista no site da Marinha https://www.com1dn.mar.mil.br/poit/poit.php.


terça-feira, 13 de setembro de 2011

Técnicas novas de cultivo in vitro de orquídeas e padrões de contaminação

Já postei algo aqui (Exemplos de contaminações no cultivo in vitro) e aqui (Retirando as orquídeas dos frascos - 1) sobre este assunto, mas agora tentando dar um novo foco venho a escrever este.

No decorrer do tempo que venho me aventurando no cultivo in vitro de orquídeas muitas foram as tentativas, todas elas muito proveitosas, mesmo que servindo para demonstrar o que não fazer nas próximas... Abaixo algumas dessas últimas. 












Testando areia grossa e algodão visando substituir o ágar que é agente gelificante que geralmente é empregado, não fui bem sucedido mas algumas potencialidades ainda estão na "gaveta" para tentar ir desenvolvendo mais em uma outra hora.


O que considero como grande trunfo foram algumas técnicas de descontaminação que desenvolvi junto a colegas daqui da UFV como Aline Fontes, André Santos e Donizetti Rodrigues, algo que também vem sendo feito por muitos outros pesquisadores mundo afora, embora cada uma dessas técnicas com seus detalhes particulares.

A motivação para o desenvolvimento dessas técnicas foi desmitificar um pouco a cultura in vitro  de orquídeas, que na cultura de tecidos in vitro em si é onde se vê mais pessoas não diretamente ligadas ao ambiente acadêmico trabalhando. 

Sempre vi em revistas por aí receitas ditas caseiras indicando acrescentar ingredientes como água destilada e um monte de frutas, frutas cultivadas em sistema orgânico inclusive, alegando que agrotóxicos que foram aplicados para ajudar as plantas produzirem seus frutos necessariamente prejudicariam as orquídeas. Bom, para "avacalhar" tenho mostrado que pode ser feito até com água da torneira e água de coco de caixinha, cheia de conservantes.

Já postei aqui (Formulação de meio de cultura para o cultivo in vitro de boa parte das orquídeas) uma fórmula simples, sendo basicamente para cada litro final: 200 mL de água de coco; 2 g de carvão em pó ativado; 25 g de açúcar tipo cristal; 5 g de adubo solúvel. Da época deste post antigo para cá aumentamos a dose de adubo de 3 para 5 g/L, evidentemente que quanto melhor o adubo melhor o resultado, vejam nos rótulos se eles se preocupam em fornecerem a maior diversidade de nutrientes possíveis, isto geralmente é um bom indicativo.

Passei muito tempo sem semear as sementes que fui juntando nos últimos anos, especialmente do meu orquidário, e ultimamente tenho semeado em baterias, as vezes tiro um dia para semear até 30 cruzamentos diferentes:




Chama a atenção alguns padrões de contaminação despontando nos frascos, para que é importante estar atento e para saber interpretar cada caso, pois o diagnóstico correto de um frasco contaminado nos diz onde foi o erro e o que fazer para corrigir o problema.


Nas fotos abaixo notam-se que as contaminações surgiram no contato com parede interna do recipiente e alastra-se para o meio da superfície do meio de cultura:












Neste caso o que se tem a fazer é procurar lavar bem cada recipiente antes de adicionar o meio de cultura, para que não fiquem ciscos abrigando os inóculos de microrganismos onde então ficam protegidos dos agentes descontaminantes.

Agora o quadro que nos dá ideia de que a contaminação surgiu devido a ineficiência de alguma técnica de descontaminação, vê-se as colônias de microrganismos saindo de dentro do volume de meio de cultura:






Quando vou testando técnicas de descontaminação do meio de cultura costumo deixar alguns potes abertos ao lado dos fechados como testemunha, para ter uma ideia do tempo mínimo de que aparecerão contaminações sob cada condição de formulação do meio de cultura e de condições de temperatura, carga de contaminação no ambiente dentre outras variáveis que interferem no crescimento microbiano.


Pode-se notar também na foto acima que o frasco destampado está com seu volume de meio de cultura menor do que os demais tampados, o que se deve á acentuada perda de água. Então, se notarem meios de cultura contaminados e ressecados mesmo que em recipientes fechados provavelmente é porque o frasco está mal vedado.


Quando a técnica de descontaminação é eficiente o meio de cultura pode fica sem contaminar por até anos guardado, embora inevitavelmente também se resseque com o tempo, embora que bem lentamente quando a vedação da tampa é boa, e na abertura do recipiente após algum tempo, quando os agentes descontaminantes geralmente já perderam parte do efeito, são comuns contaminações por simples queda de inóculos de microrganismos na superfície, com inícios de colônias aparecendo aleatoriamente sobre a superfície do meio de cultura:









Mostrei acima bastante fotos de contaminações, em parte porque até acho elas bonitas, e também para dar a idéia de que é muito comum, e desenvolver técnicas é uma tarefa árdua, com muitas tentativas para se chegar a um resultado como o abaixo e o postado no post anterior (Fotos de resultados de técnicas caseiras de semeio in vitro de orquídeas):


Quando se trabalha com uma diversidade grande de sementes de espécies e de gêneros de orquídeas vem surgindo algumas idéias interessantes com a observação do conjunto, especialmente a respeito das características das próprias sementes aparentemente interferirem da facilidade (ou dificuldade) de serem descontaminados nos procedimentos. Abaixo fotos de sementes de três orquídeas bem diferentes ampliadas cerca de 200 vezes e tratadas com o corante azul de toluidina para destacar a testa que normalmente é translúcida, a testa é a parte fibrosa, geralmente denominada de parte alada, pois as sementes que apresentam ela mais desenvolvida se dispersam mais pelo vento, Cattleya granulosa, Epidendrum secundum e Vanda tricolor. Ambas sementes foram semeadas há umas 2 semanas antes das fotos, e o embrião (verde) já está entumescido e relativamente desenvolvido nesta época.





Agora a sessão "curiosidades"...

Abaixo dois potes do resultado de um semeio no dia 28/7/2011 de sementes de Laelia jongheana (ou Cattleya jongheana, ou Hadrolaelia jongheana...) colhidas no habitat em 24/9/2011 , um pote contaminado e um outro não contaminado já na fase de protocórmios com "protofolha" (no inglês o termo é likeleaf) aparecendo já também:

O interessante deste supracitado cruzamento, o meu de número 129, é que é o que usei neste post de outubro de 2007 (Armazenamento de sementes de orquídeas) para ilustrar as etapas de acondicionamento e armazenamento de sementes de orquídeas, esta aí uma técnica bem simples e eficiente de se conservar sementes de orquídeas a longo prazo, neste caso por 4 anos.

Outra curiosidade, uma que achei engraçado quando vi, nas fotos abaixo trevos germinados em um pote onde onde se semeou orquídeas, as sementes de trevos foram como contaminantes das sementes de orquídeas: